A Indústria da Construção é um segmento que deve sempre ser considerado nas proposições e medidas apresentadas por quaisquer chefes de estado ou candidatos ao pleito, principalmente por se tratar de um mercado cujos investimentos e planejamentos são no geral, a longo prazo.
As expectativas giram em torno das mudanças que podem ocorrer entre um governo e outro, principalmente quanto a medidas de incentivo fiscal e tributário para a área, bem como quanto as possíveis alterações nas políticas públicas habitacionais.
No Brasil, o maior exemplo disso é o programa habitacional Minha Casa Minha Vida, denominado Casa Verde Amarela no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Para além das medidas econômicas que podem influenciar o mercado imobiliário de modo geral, este mercado deve sempre estar atento às regras que regem o referido programa, haja vista sua abrangência, que lhe confere um papel de destaque nos resultados financeiros da Construção Civil.
Antes de nos atermos às expectativas do mercado imobiliário diante da mudança de governo, vejamos o que mudou no programa Minha Casa Minha Vida, que voltou a ser chamado assim após a eleição de Luís Inácio Lula da Silva no segundo turno das eleições de 2022.
As principais diferenças entre o Minha Casa Minha Vida (tanto o antigo como o novo, de 2023) e o Casa Verde Amarela, do Governo Bolsonaro, residem nas divisões e critérios das Faixas ou Grupos de beneficiários, bem como nas taxas de juros aplicadas a cada uma das Faixas ou Grupos.
Sob o governo petista, o programa Minha Casa, Minha Vida oferecia a Faixa 1, destinada a famílias com renda mensal inferior a dois salários mínimos, sem a cobrança de juros aos beneficiários e sem análise de crédito. Essa abordagem possibilitou o acesso ao financiamento habitacional para famílias com renda muito baixa e endividadas.
No entanto, durante a gestão Bolsonaro, o programa foi renomeado para Casa Verde Amarela e a Faixa 1 foi eliminada, sendo substituída pelo Grupo 1, que atende apenas famílias com renda de dois salários mínimos e cobra juros nominais de até 4,75% ao ano, ou 4,25% ao ano para cotistas do FGTS.
Vejamos mais detalhadamente:
Minha Casa Minha Vida
Faixa 1: Renda de até R$ 1,8 mil
Faixa 1,5: Renda de até R$ 2,6 mil
Faixa 2: Renda de até R$ 4 mil
Faixa 3: Renda de até R$ 7 mil
Dessa forma, perceba que, no Minha Casa Minha Vida (parâmetros dos primeiros mandatos do Presidente Lula e ex-presidenta Dilma), a Faixa 1 contemplava pessoas com renda a partir de R$ 1.800. Por outro lado, com o programa Casa Verde Amarela, a renda inicial é de R$ 2.400:
Casa Verde e Amarela:
Grupo 1: Renda de até R$ 2.400.
Grupo 2: Renda entre R$ 2.400,01 e R$ 4.400.
Grupo 3: Renda entre R$ 4.400,01 e R$ 8 mil.
Quanto às taxas de juros, as diferenças são:
Minha Casa Minha Vida:
Faixa 1,5: Taxa de juros 5% (não cotista do FGTS) e 4,5% (cotista do FGTS)
Faixa 2: Taxa de juros de 5,5% a 7% (não cotista) e de 5% a 6,5% (cotista)
Faixa 3: Taxa de juros de 8,16% (não cotista) e 7,66% (cotista)
Casa Verde e Amarela:
Grupo 1: Regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, as taxas de juros são 4,5% a 4,75% para cotistas do FGTS e de 5% a 5,25% para não cotista do FGTS).
Regiões Norte e Nordeste, os juros são de 4,25% a 4,5% para cotistas do Fundo de Garantia por Tempo de Serviços, e 4,75% a 5% para não cotistas.
Grupo 2: Regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, as taxas de juros são 5% a 6,50% para cotistas do FGTS e de 5,50% a 7% para não cotista do FGTS).
Regiões Norte e Nordeste, os juros são de 4,75% a 6,50% para cotistas do Fundo de Garantia por Tempo de Serviços, e 5,25% a 7% para não cotistas.
Grupo 3: As taxas de juros são iguais para todas as regiões do Brasil, que variam de de 8,16% (não cotista) e de 7,66% (cotista).
É importante salientar que as taxas de juros do programa Minha Casa, Minha Vida apresentadas aqui são referentes à última etapa do programa, no governo Dilma Rousseff. As taxas para a 4ª fase do programa, no mandato do presidente Lula, ainda não foram definidas.
No entanto, algumas mudanças no programa já foram anunciadas pelo governo federal, como a proposta de destinar 50% das unidades financiadas ou subsidiadas para a faixa 1 do programa, destinado às famílias com renda bruta de até R$ 2.640. Os subsídios nessa faixa variam entre 85% e 95%.
A meta do governo Lula é contratar 2 milhões de moradias até o fim do mandado em 2026. A previsão é de que o teto atual do valor do imóvel na faixa 1, de R$ 96 mil, seja ampliado.
Devido sua abrangência e por seus investimentos a longo prazo, o Mercado Imobiliário tende a seguir tendências esperadas dentro de um espectro de possibilidades, independente de quem esteja à frente do poder executivo.
A entrevista do presidente da CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), José Carlos Martins, à Folha de São Paulo demonstra bom ânimo do Mercado Imobiliário diante das indicações de como o novo ministeriado lidará com a questão da habitação no Governo Lula.
Uma das referidas indicações é, por exemplo, a promessa do novo Ministro das Cidades do Governo Lula, de que sua equipe já começará a trabalhar pela reconstrução do Minha Casa, Minha Vida, já havendo R$10 bilhões reservados para o programa.
Entrevistados, representantes de grandes empresas do segmento demonstram cautela, porém otimismo.
Para Ricardo Ribeiro Gontijo, da Direcional, as mudanças realizadas no programa Casa Verde e Amarela foram cruciais para o cenário, especialmente para as incorporadoras que investem no público de baixa renda.
Leandro Melnick, da Even, afirma que o setor tem enfrentado alguns obstáculos ao incorporar a inflação dos insumos construtivos nos preços dos empreendimentos. Além disso, o empobrecimento da população é outro desafio para o setor. No entanto, ele permanece otimista e espera que a relação entre custo e valor dos imóveis melhore no próximo ano. Melnick é também presidente do conselho de administração da incorporadora gaúcha Melnick (MELK3).
Diego Villar, da Moura Dubeux, compartilha das dificuldades mencionadas por Melnick e afirma que sentiu dificuldade em repassar os custos para o consumidor. No entanto, ele encontrou na “segunda residência” um nicho promissor para superar os desafios macroeconômicos.
Apesar do já previsto esfriamento do Mercado Imobiliário em nível mundial, devido à Guerra na Ucrânia, bem como aumento de juros e inflação em todo o mundo, algumas decisões relativas às políticas tributárias apaziguam a ansiedade, conforme pontua Danilo Igliori, Professor do Departamento de Economia da USP.
“Entender em quanto tempo o governo consegue dar condição para que o Banco Central começar a baixar os juros é uma questão-chave. Essa movimentação estimula atividades econômicas e pode fazer com que o esfriamento do mercado imobiliário seja mais curto e menos agressivo.”
Ele acrescenta que o Governo precisa, portanto, adotar estratégias de política macroeconômica não populistas. “O Governo encaminha a formação de uma coalizão forte e sólida no congresso e a reforma tributária aparece como prioridade, mostrar que está cuidando dos gastos públicos e endereçando reformas pode dar um reforço de longo prazo para a questão fiscal.”